sábado, 25 de abril de 2015

Paraíso negro


Não sentia vontade de escrever, nem de fazer nada. Era uma daquelas dores que te fazem engasgar com lágrimas sem motivo. Uma dor sem motivo, que mata e faz descer ao fundo do posso. Sozinha, sempre sozinha. Sozinha nas batalhas e guerras, contando apenas com ela mesma e suas preparações. Derramando sangue sem apoio, sem consolo. E ninguém entende sua dor. E ninguém diz. E ninguém sabe. E todos se vão uma hora ou outra, inventando motivos, inventando desculpas. Sozinha de novo. Vivendo num paraíso negro de dores sem sentido.




                              Valéria Mares

segunda-feira, 20 de abril de 2015

Lua da poesia

Sou a lua da poesia.
Na nova sou papel em branco;
na crescente sou ponta de caneta;
na cheia sou verso sufocado
e na minguante, sou estrofe morta.







                   Valéria Mares





sábado, 18 de abril de 2015

Escrever não é talento

Escrever não é talento, é castigo. É comer e não poder engolir, ter que vomitar. É ferida que não sara e sangra em versos. Escrever é ver cada pequena coisa do mundo penetrar-lhe o âmago, afiadas. Escrever é o preço que se paga por enxergar o mundo. É como olhar para o sol e, mesmo com a dor, continuar a olhar. Escrever é tortura com gosto de café amargo. Escrever não é talento, é um carma que todo aquele que sente sua humanidade plenamente tem que pagar.





                     Valéria Mares

segunda-feira, 13 de abril de 2015

O tempo

Não sou muito de escreve textos motivacionais e essas coisas, mas há momentos na vida em que nos sentimos tão plenos e inteiros que escrever sobre qualquer outra coisa é quase impossível. Começo falando sobre o tempo, o grande Deus que rege nossas vidas, Cronos. O julgamos tão mal, não acham? Logo aquele que mais nos ensina, nosso grande professor. O tempo me ensinou que o mundo gira, que as coisas se movem, oscilam. Então, deixe que o tempo passe, deixe que sua fúria o consuma, como me consumiu. Os anos me ensinaram serenidade, plenitude e paciência. Com o tempo eu descobri que nem tudo é matéria, que a mente envelhece mais rápido. Hoje minha mente tem 70 anos e volta e meia me diz a coisa certa a fazer. Ame o tempo, valorize-o. Ninguém é feliz em cada segundo, mas todos nós podemos tornar cada segundo mais feliz, apena olhando para eles com olhos ternos. Nesse instante, escrevendo esse texto, estou feliz. Quanto ao próximo, só
o tempo me mostrará.



                   Valéria Mares

domingo, 5 de abril de 2015

Feita de cores

Qualquer compreensão não me é bem vinda. Eu não gosto de ser compreendida, gosto de ser sentida, entende? A compreensão gera um desconforto em mim. Como alguém pode me compreender se nem eu mesma o faço? Impossível. Então não venha me dizer que me entende, que conhece os segredos por trás do meu cabelo volumoso, do meu olhar selvagem e do meu batom vermelho, porque é mentira. Você vê apenas uma imagem pintada de mim, entretanto, já parou para pensar em quantas cores foram misturadas para se chegar ao meu tom? Sou rubra de corpo e alma, querido, sou um vermelho quase líquido de outras cores. Sou da cor que eu quiser. Eu me pinto, borro e choro. Quando tiver desvendado o segredo das cores, volte aqui e diga que me compreende, será mentira, mas estará no caminho certo.




                       Valéria Mares

Medo morto

Morreu em mim naquela noite solitária. Morreu dentro da minha carne, dos meus ossos. Sangrou, tingindo do mais puro e lindo vermelho todo o meu corpo magro e branco. Matei-o com a adaga mais afiada, guardada virgem por anos de existência da minha alma. Penetrei-lhe com a lâmina até o líquido rubro espalhar-se graciosamente. Suspirei aliviada quando a morte o pegou sorrateira, levanto-o para o inferno, o tártaro, valhalla ou seja lá o que ele acreditava. Morreu meu medo naquela noite de outono, quando a lua de sangue iluminava o céu. Morreu meu medo quando descobri quem eu sou. Morreu meu medo com a adaga da verdade íntima do meu ser. Sangrou meu medo, banhando-me de prazer. Um prazer de ser pura e verdadeira, um prazer de medo morto.

                                                         Valéria  Mares